Envelhecimento Sustentável e Saúde Planetária: O Papel Estratégico das Florestas Urbanas

O envelhecimento sustentável configura-se como um processo multifacetado que envolve interações entre fatores geográficos, sociais e institucionais, refletindo a maneira como políticas públicas e dinâmicas comunitárias moldam a experiência de envelhecer.

Nesse campo, o conceito de aging in place é central, pois enfatiza a permanência da pessoa idosa em seu ambiente habitual, preservando autonomia, dignidade e vínculos sociais [1]. Essa abordagem dialoga com perspectivas como envelhecimento saudável, ativo, produtivo e positivo, todas orientadas pela valorização da independência funcional, do bem-estar psicossocial e da manutenção da participação comunitária ao longo do curso da vida [2].

Assim, o envelhecimento sustentável encontra sentido em contextos nos quais o ambiente físico, as redes de apoio e o estilo de vida contribuem para que idosos possam permanecer em suas comunidades de forma segura e integrada.

As pesquisas nesse campo têm se concentrado na necessidade de promover qualidade de vida, integração social e adaptação dos espaços às demandas do envelhecimento [3]. Contudo, ainda persiste ausência de definição consensual, o que dificulta a formulação de políticas, o estabelecimento de metas e a construção de estratégias eficazes em diferentes escalas. Essa lacuna reforça a importância de ampliar o diálogo interdisciplinar e integrar fatores ambientais, socioculturais e econômicos ao debate.

Nesse cenário, o conceito de Saúde Planetária complementa a discussão ao afirmar que a saúde da civilização humana depende diretamente do estado dos sistemas naturais que sustentam a vida [4]. A Saúde Planetária reconhece que fenômenos como mudanças climáticas, perda de biodiversidade, poluição e esgotamento de recursos comprometem a saúde humana, a segurança alimentar, o acesso à água, a estabilidade social e a equidade intergeracional [5]. Seu enfoque é sistêmico, entendendo que processos ambientais e sociais são profundamente interdependentes.

No envelhecimento, essa abordagem mostra-se particularmente relevante, dado que populações idosas são mais vulneráveis a eventos climáticos extremos, ondas de calor, poluição atmosférica e insegurança alimentar. Esses fatores agravam as condições crônicas, reduzem a mobilidade e aumentam a mortalidade.

Ambientes urbanos planejados a partir dos princípios da Saúde Planetária — incluindo infraestrutura verde, mobilidade ativa, acesso a alimentos frescos e sistemas sustentáveis de recursos — promovem autonomia, bem-estar e coesão social na velhice [3]. Assim, envelhecimento sustentável e Saúde Planetária convergem ao reconhecer que um ambiente equilibrado é condição para uma vida longa com qualidade.

A relação entre envelhecimento e sustentabilidade vem ganhando destaque, sobretudo porque a sustentabilidade, usualmente associada apenas ao meio ambiente, integra também dimensões socioeconômicas, culturais e de bem-estar individual [3].

Essa ampliação conceitual permite compreender que o envelhecimento populacional deve ser analisado à luz dos três pilares da sustentabilidade: social, econômico e ambiental. A intersecção desses pilares revela oportunidades para novas práticas, políticas públicas e pesquisas que considerem o envelhecimento como fenômeno complexo e multidimensional [7].

Nos países de baixa e média renda, particularmente no Sul Global, a gestão do envelhecimento é dificultada por desigualdades estruturais, limitações em infraestrutura urbana, fragilidades nos sistemas de saúde e insuficiência de políticas sociais [6, 7].

Essas barreiras reforçam a necessidade de repensar os referenciais teóricos sobre envelhecimento, superando visões estritamente biológicas e reconhecendo a influência dos contextos sociais e ambientais sobre o curso de vida [7].

Nesse sentido, a integração do envelhecimento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e à Década do Envelhecimento Saudável (2021–2030) reforça seu caráter transversal, conforme a Figura 2 (OMS, 2020). Embora o envelhecimento esteja usualmente vinculado ao ODS 3 (Saúde e Bem-Estar), análises mais amplas mostram que os 17 ODS se relacionam direta ou indiretamente ao envelhecer.

Figura 2. Apresentação em espiral dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Fonte: Produção autoral (2025).

O ODS 1 (Erradicação da Pobreza) e o ODS 2 (Fome Zero) influenciam as condições materiais da velhice. O ODS 4 (Educação de Qualidade) impacta trajetórias de vida e oportunidades ao longo do envelhecimento. O ODS 5 (Igualdade de Gênero) aborda desigualdades que afetam especialmente mulheres idosas.

O ODS 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis) é essencial para garantir moradias adequadas e infraestrutura urbana inclusiva. O ODS 13 (Ação Climática) relaciona-se à proteção dos idosos frente a eventos climáticos extremos, enquanto ODS como o 7 (Energia Limpa e Acessível) e o 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes) tratam de dimensões como justiça ambiental, participação social e enfrentamento ao idadismo.

Ao reconhecer essas interdependências, torna-se evidente que o envelhecimento sustentável exige uma abordagem integrada que considere simultaneamente fatores ambientais, sociais, econômicos e culturais. A transição de uma perspectiva centrada apenas em aspectos biomédicos para uma visão sistêmica permite projetar sociedades mais resilientes, solidárias e preparadas para o envelhecimento populacional.

Paralelamente, às transformações demográficas ocorrem em um mundo cada vez mais urbanizado. Em 2021, 55% da população mundial vivia em áreas urbanas, proporção que deve chegar a 68% até 2050 (UN-HABITAT, 2022). No Brasil, 87,4% da população residia em áreas urbanas em 2022 (IBGE, 2023). Esse aumento acentuado implica que a maioria das pessoas idosas habitará cidades, especialmente em países de renda baixa e média, ampliando desafios ligados à acessibilidade, mobilidade, pobreza urbana e vulnerabilidade climática.

As cidades, entendidas como sistemas dinâmicos, sofrem transformações contínuas resultantes de ações governamentais, coletivas e individuais, nem sempre planejadas (UN-HABITAT, 2022). A ausência de planejamento urbano eficaz leva a impactos ambientais significativos, degrada a qualidade de vida e reduz a resiliência urbana [5]. Entre os problemas mais recorrentes estão o uso inadequado do solo, a expansão desordenada e a insuficiência de áreas verdes, fatores que agravam desigualdades e fragilizam ecossistemas.

Nesse contexto, instrumentos como Manuais de Arborização Urbana tornam-se fundamentais para orientar práticas de plantio, manejo e conservação das áreas verdes. No entanto, poucos municípios brasileiros possuem tais documentos, e, quando os possuem, sua aplicação não é garantida, dificultando inclusive o acesso a recursos públicos destinados à infraestrutura verde.

Para enfrentar esses desafios, Soluções Baseadas na Natureza (SbN) surgem como estratégias eficazes. Essas soluções incluem infraestrutura verde e azul, serviços ecossistêmicos e engenharia ecológica, promovendo adaptação climática, mitigação de impactos e regeneração urbana [8]. Entre as SbN, as florestas urbanas destacam-se por seu papel ecológico e social.

A Infraestrutura Verde constitui uma rede planejada de áreas vegetadas que ampliam a biodiversidade e oferecem múltiplos serviços ecossistêmicos [8]. As florestas urbanas integram esse sistema, abrangendo árvores, arbustos e vegetação associada, configurando elementos fundamentais para cidades mais saudáveis e resilientes. Elas desempenham funções ambientais, recreativas, sanitárias e estéticas [5], contribuindo para reduzir temperaturas, atenuar ilhas de calor, melhorar a infiltração de água e mitigar a poluição [9].

Entretanto, esses ecossistemas também sofrem com estresses climáticos, manejo inadequado, pragas e fragmentação [10]. Quando degradadas, florestas podem liberar carbono armazenado, agravando impactos ambientais [8].

No âmbito do envelhecimento sustentável, as florestas urbanas (Figura 3) oferecem benefícios essenciais: reduzem extremos térmicos, qualificam o ar, promovem sociabilidade e favorecem atividades ao ar livre, fundamentais para saúde física e mental de idosos. A seleção de espécies resilientes, o manejo contínuo e políticas de conservação fortalecem a resiliência urbana e ampliam o direito à cidade para populações envelhecidas.

Figura 3. Benefícios e estratégias ecossistêmicas advindas das Florestas Urbanas. Fonte: Baseado em kalamunda.wa.gov.au (2023). Elaborado pelo autor (2025).

Em Fortaleza, capital do Ceará, o Trecho 6 do Parque Rachel de Queiroz destaca-se como um relevante serviço ecossistêmico urbano (Figuras 1 e 4). A intervenção recebeu ampla projeção nacional e internacional ao ser reconhecida como Obra do Ano 2023 pelo ArchDaily Brasil, além de conquistar o LOOP Design Awards e o Iconic Award na categoria Arquitetura Inovadora.

Figura 4. Trecho 6, Parque Rachel de Queiroz, cidade de Fortaleza, Ceará. Fonte: architectus.com.br/projeto/parque-rachel-de-queiroz/ (2022).

Somam-se a esses reconhecimentos a menção honrosa do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) na Convocatoria Pública de Prácticas Innovadoras de la Nueva Agenda Urbana, consolidando o projeto como referência em qualidade espacial e inovação no espaço público contemporâneo.

A análise detalhada desse trecho e a discussão aprofundada sobre Soluções Baseadas na Natureza (SbN) e florestas urbanas estão disponíveis gratuitamente no capítulo “Envelhecimento Sustentável Integrado às Florestas Urbanas: Proposições Baseadas na Natureza Responsivas às Mudanças Climáticas”, escrito pelos arquitetos e urbanistas Ciro Albuquerque, Luiza Bezerra e Zilsa Santiago, do Instituto de Arquitetura, Urbanismo e Design (IAUD) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Assim, a articulação entre Saúde Planetária, envelhecimento sustentável e infraestrutura verde representa um caminho promissor para construir cidades inclusivas, ambientalmente equilibradas e preparadas para o envelhecimento populacional global.

Referências

[1] WU, W.; KAUSHIK, I. Design for Sustainable Aging: Improving Design Communication Through Building Information Modeling and Game Engine Integration. Procedia Engineering, v. 118, p. 926–933, 2015.

[2] GRAZULEVICIUTE-VILENISKE, I. et al. Aging, Living Environment, and Sustainability: What Should be Taken into Account? Sustainability, v. 12, n. 5, 2020.

[3] YOON, H.; HUBER, L.; KIM, C. Sustainable Aging and Leisure Behaviors: Do Leisure Activities Matter in Aging Well? Sustainability, v. 13, n. 4, p. 2348, 22 fev. 2021.

[4] WHITMEE, S. et al. Safeguarding human health in the Anthropocene epoch: report of The Rockefeller Foundation–Lancet Commission on planetary health. The Lancet, v. 386, 2015.

[5] BRAŠANAC-BOSANAC, L. et al. Urban forests and climate change. Sustainable Forestry, n. 85-86, p. 1–12, 1 jan. 2022.

[6] BENTON, L. et al. Need for planetary health perspective in guidance for complex interventions for climate and health. BMJ, v. 389, p. e083337, 3 jun. 2025.

[7] KOMP-LEUKKUNEN, K.; SARASMA, J. Social Sustainability in Aging Populations: A Systematic Literature Review. The Gerontologist, v. 64, n. 5, 1 ago. 2023.

[8] ELLIOTT, H.; EON, C.; BREADSELL, J. K. Improving City Vitality through Urban Heat Reduction with Green Infrastructure and Design Solutions: A Systematic Literature Review. Buildings, v. 10, n. 12, p. 219, 27 nov. 2020.

[9] CZAJA, M.; KOŁTON, A.; MURAS, P. The Complex Issue of Urban Trees—Stress Factor Accumulation and Ecological Service Possibilities. Forests, v. 11, n. 9, p. 932, 26 ago. 2020.

[10] EDEIGBA, B. A. et al. Urban green spaces and their impact on environmental health: A Global Review. World Journal of Advanced Research and Reviews, v. 21, n. 2, p. 917–927, 2024.

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