Quando falamos sobre modos de morar na velhice, há um risco de que o entendimento gere essa dúvida. Evidentemente não há fórmulas genéricas ou padrões para atender desejos, apenas recomendações para necessidades específicas. Manoel de Barros, poeta sul-mato-grossense que morreu em 2014, aos 97 anos, falava pouco mas dizia muito através da sua poesia, em especial sobre seu modo de ver a vida. Disse em “O apanhador de desperdícios” (Memórias inventadas – As Infâncias de Manoel de Barros, 2010):
“Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. (…) Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz por isso. (…) Só uso a palavra para compor meus silêncios.”
Ao destacar que seu comportamento quieto não refletia um ser vazio mas, ao contrário, justificava a criação de muitas ideias em pensamentos livres sobre a vida, Manoel de Barros demonstrava que lhe bastava a simplicidade de uma casa de fazenda, confortável mas despojada de excessos. Ele mesmo dizia que vivia com conforto por ter herdado uma fazenda… Via-se como parte daquele ambiente natural, do qual raramente se afastava, como declarou em “Retrato do artista quando coisa” (1998):
“A maior riqueza do homem é sua incompletude. Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou — eu não aceito. Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 da tarde, que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc. Perdoai. Mas eu preciso ser Outros. Eu penso renovar o homem usando borboletas.”
Somos resultados de vidas diferentes, com hábitos e acontecimentos que marcam de modo igualmente diferente. Então, como pensar numa moradia para a velhice que atenda diferentes modos de ver a vida? Este é o grande desafio das residências coletivas, onde é preciso não somente pensar em conforto físico e segurança mas, também, em receber pessoas com diferentes expectativas e temperamentos. Assim Manoel de Barros se descreveu em “Matéria de Poesia” (2001):
“Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: Liberdade caça jeito”.
Aos 84 anos, quando publicou essa autodefinição, Manoel de Barros mostrava não estar condicionado a padrões, e isso o destacou na poesia. Assim como ele, muitos idosos procuram lugares que reflitam seu modo de ver a vida, seja em residências unifamiliares ou em moradias coletivas. O que importa, portanto, é saber como oferecer um bom lugar, com paz além de segurança e conforto, mantendo elementos importantes da memória. Este é o desafio que nos leva a sermos modulares em preconceitos, egoísmos e comparações, para que tomemos decisões menos preconceituosas.